Com debates e música, 14M na Adufs homenageia Marielle

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Vida e luta de Marielle são memoradas em homenagem (Carolina Timoteo/ ADUFS)
Vida e luta de Marielle são memoradas em homenagem (Carolina Timoteo/ ADUFS)

Na última quinta-feira, 14 de março, completou um ano da execução de Marielle Franco e Anderson Gomes. Nesta semana, os dois milicianos suspeitos de puxar o gatilho foram presos, mas ainda queremos saber: quem mandou matar Marielle?

É evidente que foi um crime político. Em sua atuação na Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro, Marielle atuou na defesa dos direitos humanos e denunciou várias irregularidades envolvendo o mundo político e as milícias.

Em respeito à sua luta e à sua memória, a ADUFS organizou nesta quinta o “14M na UFS”, que reuniu mais de 100 pessoas no auditório do sindicato ao longo do dia. A programação contou com dois debates, apresentação musical de Pedro Munhoz, homenagem a Marielle Franco e sorteio do livro de sua pesquisa sobre o funcionamento das UPP’s nas favelas do Rio.

“A pauta LGBT e o governo Bolsonaro”

Na primeira mesa do 14M, no período da tarde, intitulada "A pauta LGBT e o governo Bolsonaro", estiveram presentes Renan Quinalha, Wellington Costas e Adriana Lohanna, com mediação de Romero Venâncio, organizador do dia de homenagens a Marielle Franco na UFS.

Mais de 50 pessoas lotaram o auditório do sindicato e foram presentadas com as famosas placas de Marielle. Vale lembrar que, antes do início do debate, o presidente Airton Souza também fez uma saudação em nome da ADUFS, gritando "Marielle Presente".

Em sua intervenção, Renan Quinalha falou sobre a ideologia binária que estrutura a LGBTfobia no Brasil. Segundo ele, a ideia segundo a qual só existem dois gênero ainda está nas raízes de muitas famílias brasileiras. Com base nas ideias da filósofa feminista Judith Butler, ele lembrou da diferença entre sexo, gênero e desejo. Em outras palavras, que o sexo que a pessoa nasce não define seu gênero, muito menos seu desejo sexual.

Quinalha também resgatou os avanços nos direitos conquistados para as LGBT's desde a Constituição de 1988 e apontou os ataques à educação e à cultura do governo Bolsonaro no que diz respeito às políticas de gênero.

Já Wellington Costa destacou a mudança de padrão de ataque aos LGBT's nas última décadas. Usando o exemplo da proibição em 1999 da publicação de uma capa de revista com dois homens se beijando na capa, ele defendeu que, se antes a estratégia era invisibilizar, hoje o modo de ataque é a exposição e a ridicularização. Ele lembrou das mensagens e das imagens veiculadas por Jair Bolsonaro no Twitter durante no Carnaval - caso que ficou conhecido mundialmente como "golden shower".

O professor também denunciou a LGBTfobia nas escolas e universidades, questionando os motivos de alunos e professores, muitos deles gays, lésbicas, etc, apoiarem um governo que ataca direitos humanos como uma política institucional.

Por fim, Adriana Lohana falou sobre sua realidade de mulher trans e professora em Lagarto, no agreste de Sergipe. Ela contou casos de preconceito em escolas, no campus da UFS e mesmo junto à Prefeitura. A professora destacou a ausência de políticas públicas para a população trans, à exceção de medidas isoladas, como decretos e portarias. "Lei mesmo não tem", denunciou.

"Já perguntaram a vocês no IBGE se vocês são gays, lésbicas? Já te perguntaram na delegacia?", questionou Lohana, afirmando que é preciso ir além da luta pelo reconhecimento do nome social, principal vitória do movimento trans até hoje no Brasil.

Marielle Vive!

Antes de se iniciar o debate “Marielle Vive”, no período da noite, foi inaugurada a placa em memória à Marielle, com distribuição de outros exemplares para o público presente.

A mesa de debate contou com abertura do professor e diretor da ADUFS Romero Venâncio, mediação de Hortência Marques, militante do PSOL, e participação das professoras  Andréa Dipieri, Sandra Oliveira e Tereza Cristina Santos.

Hortência fez um breve relato do ato ecumênico, político e cultural que ocorreu em frente à Câmara Municipal dos vereadores de Aracaju, lembrando que aconteceram atos em mais de 10 países em memória a Marielle.

“A gente sabe que foi uma execução política orquestrada e duramente calculada. E  vamos seguir nessa campanha diária, semanal, mensal até que a gente tenha a resposta de quem foi que mandou matar Marielle” afirma.

Andréa Dipieri, do departamento de Direito, atuante na Comissão Estadual da Verdade de Sergipe, inicia sua fala falando da importância do ato e da preservação da memória: “Pensar e rememorar o caso da Marielle que foi um crime de natureza política e silenciamento das minorias, é uma estratégia do esforço da democracia.”

“Lembrar da Marielle é lembrar o conjunto de disputas políticas que se associam a ela, que são lutas para que a gente possa avançar, construir uma sociedade mais justa e igualitária de alguma forma, que os privilégios não funcionem como a única pauta, que a ideia de mérito seja desconstruída. Que a gente possa pensar e colocar em xeque o próprio funcionamento do sistema de justiça criminal, que seleciona para suas fileiras do controle criminal os mais pobres, os negros e levados à prisão. O processo de criminalização é político intencional”, complementa a professora Andréa.

A mesa seguiu com fala da professora Sandra Oliveira, do departamento de Psicologia, que expôs apontamentos do livro publicado por Marielle sobre a atuação política das UPP’s nas favelas do Rio de Janeiro. “Se a gente está trazendo o 14M para dentro da Universidade é importante lembrar também que Marielle era uma pesquisadora e publicou um trabalho sobre as Unidades de Polícia Pacificadora, que tem uma disputa narrativa midiática muito forte, no sentido de transformar essa estratégia para solucionar os problemas de segurança pública da cidade em que ela exercia o mandato.”

Sandra constatou a importância do engajamento de Marielle como pesquisadora, que levou para dentro da Universidade uma questão pulsante do Rio de Janeiro e de sua militância. “É importante destacar que nessa disputa narrativa que as UPP's ganharam, uma imagem e campanha extremamente valiosa publicitária no sentido de dizer que estava fazendo uma transformação dos territórios chamados de favela e das políticas de segurança pública, o que comprovadamente pela pesquisa não é verdade. Essas políticas de segurança militarizada que são extremamente nocivas a essa população permanecem."

Quem fechou o debate foi a professora Tereza Cristina Santos, do Serviço Social, que se sentiu honrada por estar participando da homenagem. “O significado e a importância da luta de Marielle reside no fato de que é uma luta histórica do povo negro em terras brasileiras contra a violência, a violação de direitos e contra as atrocidades que são cotidianamente cometidas contra o nosso corpo”, destacou.

Com depoimento bastante comovente, Tereza finaliza: “Não há dúvida que o sangue de Marielle fez e fará renascer tantas outras Marielles que lutarão contra as atrocidades de um senhor agrário, cujo seu poder senhorial não admite ser contestado e confrontado, afinal o seu poder opera via latifúndio, controle e domínio do Estado e na realidade são bases de seu poder econômico. Este amplamente garantido pela exploração da classe trabalhadora, fundamentalmente negra que no marco de um sistema forjado na dominação colonial em sua essência baseia-se na lógica racista".

Pedro Munhoz anima o 14M

Pedro Munhoz, “trovador do povo”, trouxe em suas canções versos afiados e acordes rebeldes, nos fazendo acreditar que outro mundo é possível. Brincalhão, fez um show bastante intimista com participação do público presente.

Sorteio do livro 

A noite se encerrou com sorteio de 8 exemplares do livro "UPP - A redução da favela a três letras: Uma análise da política de segurança pública do estado do Rio de Janeiro" pesquisa de Marielle Franco recentemente publicada. 

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