O coronavírus e as prioridades do povo brasileiro

Notícias

Saulo H. S. Silva*

O problema de saúde pública oriundo do Coronavírus, outrora da Dengue, Chikungunya ou Zika, entre outros vírus que frequentemente assolam a população brasileira, demonstra algo que sempre me pareceu muito evidente. As prioridades do Brasil não deveriam ser as pautas que são postas pelos figurões do governo.  Seja a ignóbil cruzada da justiça contra a corrupção, conforme propagandeada por Sérgio Moro e seus sequazes, ou a tese falso moralista de empoderamento de forças milicianas para atenuar os índices da insegurança pública, como é frequente em muitos discursos de autoridades políticas e agitadores militares. Muito menos é uma agenda positiva a redução da importância do Estado na vida das pessoas que mais precisam de serviços públicos e direitos civis.

Na verdade, a prioridade do Brasil deveria ser a resolução da discrepância social absurda que o posiciona entre os países mais desiguais do mundo. Porém, o que temos visto é o aparelhamento do governo nacional para ampliar o avanço da precarização do trabalho e promover a redução da economia pública aos interesses do sistema financeiro e dos grandes conglomerados empresariais.

Somos governados por gananciosos embusteiros que, aliados aos setores mais tacanhos da burguesia, desejam transformar a república em uma autêntica cleptocracia! Não existe uma só proposta do atual governo que vise resolver problemas verdadeiramente urgentes e que melhore de fato as condições materiais de seu povo. Não é por acaso que todas as reformas, as máximas econômicas do governo, o sucateamento dos serviços públicos e a retirada de direitos trabalhistas têm por objetivo distanciar a população da participação no todo da riqueza pública, cada vez mais concentrada em uma pequena percentagem de ricos da população.

Sobre esse assunto, segundo o banco Credit Suisse, em seu décimo Global wealth report (2019), “enquanto mais da metade de todos os adultos do mundo tem um patrimônio líquido abaixo de 10,000 US$, aproximadamente 1% de adultos são milionários que coletivamente possuem 44% da riqueza global” (p. 5). Quando analisamos os dados particulares do Brasil, alcançamos índices bizarros de desigualdade, “[...] estimamos que 1% dos brasileiros mais ricos possuem 49% da riqueza familiar do país” (p. 56). Segundo o mesmo relatório, “dois fatores que contribuem para a persistência da elevada desigualdade de renda são o desnível educacional da força de trabalho e a separação entre os setores formais e informais da economia” (Id. Ibid;).  Em outras palavras, aqueles que trabalham e que de fato produzem a riqueza têm acesso a parquíssimos bens por eles mesmos produzidos; é a grande maioria da população, mas não há justiça distributiva e nem políticas efetivas e duradouras para resolver essa miséria secular.  

Dessa forma, em dias tão funestos, quando novamente a classe trabalhadora é posta contra a parede por meio de ameaças de perdas de empregos e cortes de salários, não podemos esquecer os números acima e tampouco contemporizar a agenda de reformas neoliberais que distorcem as feições mínimas de uma constituição republicana. O problema está, portanto, na desvalorização da Rede Pública de Educação, no descrédito obscurantista pela ciência. Sobretudo nesses tempos de avanço do Covid-19, uma das necessidades mais urgentes do país é o investimento na promoção da saúde pública, salvaguardando definitivamente das tentativas de privatização o Sistema Único de Saúde (SUS), sempre na mira dos tentáculos usurpadores que norteiam as reformas neoliberais.

Ao fim e ao cabo, as prioridades do governo, que não são aquelas de seu povo, denotam que estamos sendo conduzidos pelas pessoas menos confiáveis para a administração da justiça pública a qual, preferencialmente, deve ser distributiva e não comutativa. Desprezando todos os valores de prudência, fraternidade, solidariedade e equidade, o timão do governo está nas mãos dos piores.

Saulo H. S. Silva é professor de Filosofia da UFS e vice-presidente da ADUFS

Veja também