Eleição para a Reitoria da UFS: um Compromisso com a Democracia

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Pedro Leite de Santana*

 

Nestes tempos de redes sociais fervilhantes, a sucessão para a reitoria da Universidade Federal de Sergipe tornou-se um debate público em nosso estado e até fora dele. Há grande e justificada inquietação acerca do processo que levará à escolha dos próximos reitor e vice-reitor da UFS.

A Constituição Federal e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) preceituam a autonomia das universidades públicas e sua gestão democrática. Na prática, entretanto, para a escolha dos dirigentes das Universidades Federais, é vigente uma legislação que não garante a efetivação destes princípios. A lei 9.192, de 21 de dezembro de 1995, e o decreto regulamentador 1.916, de 23 de maio de 1996, determinam que o reitor e o vice-reitor deverão ser escolhidos pelo Presidente da República a partir de “listas tríplices” elaboradas por um “Colégio Eleitoral Especial”, mecanismo este incompatível com a gestão democrática. Mudanças encaminhadas recentemente pelo atual governo federal, através de medida provisória que caducou, não buscavam de modo nenhum a firmação dos princípios de autonomia e gestão democrática. E também é justo observar que nunca houve atuação decisiva do parlamento para gerar uma legislação consagradora destes princípios.

Historicamente, dentro das Universidades Federais as entidades representativas dos três segmentos (docentes, discentes e técnicos) construíram um processo de consulta democrática, como etapa fundamental, visando ouvir a comunidade acadêmica. Somente depois dessa consulta é que o Colégio Eleitoral Especial, nos termos da legislação, tem se reunido para basicamente referendar a escolha da comunidade universitária. A construção e a consolidação desse movimento legítimo de democracia interna, como contraponto prático a uma legislação que nega os princípios de autonomia e de gestão democrática, podem ser revisitadas nos anais da história, e se confundem em muitos momentos com as lutas heroicas pela redemocratização de nosso país.

Para que esse processo de democracia interna funcione, há de haver três compromissos éticos e morais inarredáveis. Da Universidade com a Consulta à Comunidade, do Colégio Eleitoral Especial com o resultado da Consulta à Comunidade e dos candidatos derrotados com o respeito à nomeação do eleito.

O reitor atual em seu fim de segundo mandato, numa postura equivocada, colocando-se em franco descompasso com a história da UFS e com o seu próprio passado, tem dado sinais insistentes de que pretende patrocinar uma ruptura de compromisso da Universidade com a Consulta à Comunidade. A convocação do Colégio Eleitoral Especial para reunião no próximo dia 15 de julho, com a finalidade de elaborar as listas tríplices, deixou a comunidade universitária perplexa, uma vez que não houve ainda a Consulta à Comunidade, um pacto institucional que deve ser preservado a todo custo.

A consulta à comunidade universitária, promovida historicamente pelas entidades representativas, estava praticamente encerrada, contando com quatro chapas inscritas que atuaram com transparência e participaram de todas as etapas do processo democrático, debatendo e divulgando suas propostas publicamente dentro e fora da Universidade. Restava apenas a realização de um debate com os candidatos no Campus de Lagarto, no dia 17 de março, e a votação, nos dias 19 e 20 de março. Devido à longa suspensão das atividades presenciais forçada pela gravíssima pandemia do novo coronavírus, estes eventos devem ainda ser realizados para que tenhamos a concretização da imprescindível Consulta à Comunidade. Concretizar este processo é tarefa institucional, de todos que fazem a UFS. Temos a certeza de que os eminentes conselheiros, integrantes do Colégio Eleitoral Especial, têm firme compromisso com o princípio de gestão democrática, e, portanto, decidirão aguardar o encerramento do processo de Consulta à Comunidade, convocando nova reunião para data posterior, uma vez que isto é possibilitado pela legislação, e orientando a reitoria para que some forças com as entidades representativas no sentido de disponibilizar os meios institucionais possíveis e necessários para finalizar o processo de Consulta à Comunidade. O Artigo 9o do decreto regulamentador prevê que “as listas para escolha e nomeação serão encaminhadas ao Ministério da Educação até sessenta dias antes de findo o mandato do dirigente que estiver sendo substituído”. Considerando que o mandato do atual dirigente finda em 18 de novembro de 2020, há tempo suficiente para reorganizar e completar a consulta democrática à comunidade. 

Este é o justo caminho. Esta lição institucional de maturidade histórica e democrática é o único compromisso que se espera de todos que fazem a Universidade Federal de Sergipe, verdadeiro patrimônio do povo sergipano.

 

Pedro Leite de Santana é professor do Departamento de Engenharia Química da UFS. 06 de julho de 2020.

 

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