EM DEFESA DA UNIVERSIDADE PÚBLICA, FALEMOS DE URGÊNCIAS – Nota da Diretoria da ADUFS

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Leia abaixo a íntegra da Nota da Diretoria da ADUFS ou acesse aqui em pdf.

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Poderíamos recuar no tempo, desde a chamada "Nova República" ou para períodos como os de "Collor", "FHC" ou "Lula/Dilma", para situarmos as contradições das políticas em defesa ou manutenção da Universidade Pública. Numa sociedade de classes, singular como a brasileira e de profunda herança escravagista, a Universidade, em sua forma pública, gratuita, referenciada e autodeterminada faz grande diferença, para dizer o mínimo.

Como lugar privilegiado da produção de conhecimentos e formação qualificada de sujeitos para a promoção do desenvolvimento social, o pensamento livre e a indissociabilidade entre universidade e autonomia constituem-se imperativos que, historicamente, estiveram na agenda de luta das entidades políticas representativas daquelas/es que fazem a Universidade no nosso País.

Entretanto, desde 2016, no processo político nacional, entramos num dos piores momentos das IES desde a década de 1980. O golpe jurídico-institucional na presidente eleita e a preparação de terreno para a chegada à presidência de Bolsonaro, calibrado pela "lava-jato", prisão ilegal de Lula e apoio de setores do judiciário e da mídia dos barões, atrelada à burguesia de sempre, mudou os rumos da política desse país.

O cenário político recente é de destruição da Universidade Pública e as investidas são adversas, desde as intromissões na gestão via intervenção, para implementação do projeto de desmonte da educação pelo ajuste fiscal, com cortes orçamentários, às perseguições políticas a pesquisadoras/es, professoras/es, estudantes e técnicas/os.

Acrescente-se o avanço de um pensamento de extrema direita em todos os setores da sociedade brasileira e a pandemia que já matou mais de 290 mil pessoas desde o início de 2020 até esta data, agravando o quadro político a partir da crise sanitária e de uma governança que aprofunda o problema. A situação do Brasil é a mais grave de sua história republicana. Com 14 milhões de desempregados, confinamento social como medida de controle da pandemia, uma política de perseguição do pensamento crítico em relação à gestão da saúde e da política econômica.

Chegamos ao final do primeiro trimestre de 2021 envolvidos em um quadro de perdas de vidas, adoecimento de trabalhadoras/es e estudantes, ensino remoto e os muitos prejuízos à aprendizagem, mais a necessidade premente de permanecer vivas/os enquanto não superamos a COVID-19. Tudo isso acontecendo ao mesmo tempo em que não cessam as medidas do ajuste fiscal, com a reforma administrativa, a PEC emergencial como moeda de troca para a sobrevivência dos setores mais pauperizados e o desmonte do serviço público a ser garantido à população na pauta da destruição pelo governo/congresso e seus resultados devastadores, com destaque para as dificuldades de mobilização social para o enfrentamento do caos no qual estamos imersos nestes últimos 4 anos.

No que concerne à garantia da autonomia universitária, as ameaças são diárias e de muitas formas. Desde as já elencadas, à atual política negacionista da ciência e à intimidação ao discurso da crítica ao status quo, que se aliam às legislações que tratam das eleições no interior das IES, que vêm da Ditadura militar, com a Lei 5.540/68, pouco alterada pelo Decreto 1.916, de 23 de maio de 1996, que regulamenta o processo de definição dos dirigentes de instituições federais de ensino superior, nos termos da Lei 9.192, de 21 de dezembro de 1995, com base no qual, o Presidente da República/MEC tem sempre a prerrogativa última da escolha numa lista tríplice.

A referida norma faculta a consulta prévia à comunidade universitária, estabelece o voto com pesos diferenciados para o corpo docente (no mínimo 70%), servidoras/es técnico-administrativos e estudantes. Desde a sua promulgação, no entanto, é alvo de duras críticas e reiteradas tentativas de alteração pelas entidades representativas dos segmentos da comunidade universitária, através do ANDES - Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior, FASUBRA - Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil e UNE - União Nacional dos Estudantes, na busca do direito de escolha das/os seus/suas dirigentes de forma autônoma, democrática e respeitando a paridade no que concerne ao peso dos votos (1/3 para cada segmento). Apesar disso, nenhum governo da República conseguiu chegar a um termo e regulamentar a autonomia universitária naquilo que diz respeito a escolha das/os dirigentes. A consequência imediata disto é que a escolha do reitora/reitor recai no jogo político do governo de plantão.

Em que pese a letra da lei de 1996, na prática, como resultado da luta das entidades em defesa do direito de escolha por professoras/es, técnicas e técnicos administrativos e estudantes, vigorou um pacto com as/os dirigentes das Universidades, que vinha garantindo a realização da Consulta Pública  com voto paritário, ou seja, com pesos iguais para cada segmento, com uma lista tríplice montada pelos Conselhos a partir do resultado das Consultas e direção da Consulta Pública, seja para Reitoria ou direção dos Centros, pelas entidades representativas da comunidade universitária.

Foi nesse contexto que aconteceu a escolha de Reitor/Reitora na UFS, com o processo iniciado no segundo semestre de 2019 e encerrado em 2020. O processo foi tumultuado desde o início. O governo com medida provisória que aprofundava os efeitos antidemocráticos da atual legislação, a reitoria liderada por Ângelo Roberto Antoniolli, que não lançou candidato para a Consulta Pública e as entidades estudantis e sindicais na pressão por um processo o mais democrático possível.

A diretoria da ADUFS de então, já alertava para a importância do respeito ao processo coordenado pelas entidades representativas da UFS, naquilo que sempre foi histórico tanto para a escolha de reitores, como para diretores dos Centros, sempre orientadas pelo mesmo formato. 

Na passagem de 2019 para 2020, as entidades representativas da UFS: ADUFS, SINTUFS, DCE, APG e AAU reuniram-se em assembleia universitária para a escolha da Comissão Eleitoral e definição do cronograma eleitoral, o que foi feito democraticamente. Quatro chapas se apresentaram no prazo determinado. No decorrer do processo duas chapas se retiraram e duas chegaram até o final. O pleito ocorreu nos dias 24, 25 e 26 de agosto de 2020, a apuração foi transmitida pelos canais de Sintufs e Adufs na rede social Youtube.

A chapa 4 “InovaUFS - por uma UFS inovadora, democrática e mais humana”, encabeçada pelo professor André Maurício e professora Rozana Rivas, recebeu 64% dos votos válidos. Já a chapa 3 “Universidade necessária com autonomia e participação”, composta pelas professoras Vera Núbia e Silvana Bretas, recebeu 36% dos votos válidos.

A consulta recebeu os votos de 2053 estudantes, 683 docentes e 414 trabalhadoras e trabalhadores técnico-administrativos. O cálculo da votação final foi proporcional, fazendo com que cada categoria tivesse 1/3 de peso no número total de votos.

As entidades cumpriram seu papel para a garantia do processo democrático. Por sua vez, a inclusão do nome do prof. Walter Joviniano (vice-reitor em exercício naquele momento) na lista tríplice e a sua aprovação em primeiro lugar pelo Conselho (sem que este tivesse passado pela Consulta à comunidade), cuja composição tem maioria aliada aos gestores, culminou no completo desrespeito aos interesses e escolha da comunidade universitária.

Na sequência, tem início o imbróglio político e judicial. Em novembro, a nomeação de uma interventora, sem fundamento legal, já que há previsão estatutária para nomeação de decano em caso de vacância de cargo para a reitoria da UFS, solapando qualquer perspectiva de autonomia e aprofundando um quadro que exigiu cautela e responsabilidade por parte da ADUFS para o estabelecimento da agenda de luta.

Entre novembro de 2020 e março de 2021, a intervenção do Ministério da Educação representou a direta gestão do MEC na Universidade Federal de Sergipe confirmada na atuação da interventora, com suas reiteradas declarações de sintonia com as diretrizes da gestão Bolsonaro para a educação e para a UFS. Tais diretrizes vêm sendo anunciadas desde a campanha eleitoral, com os ataques à Universidade Pública, declarações do presidente e dois ex-ministros da educação, que manifestadamente anunciaram seu desrespeito à Universidade e sua repulsa à ciência como caminho para o desenvolvimento. Exposições de desrespeito aos que fazem a Universidade e os cortes de orçamento que já repercutem em paralisação de pesquisas e obras no interior das IES, perseguição a pesquisadoras/es, entre outras. Entre os atos da interventora da UFS veio a nomeação para cargos de pró-reitorias, de pessoas cujas declarações ferem a CF, no que concerne ao respeito ao princípio da laicidade necessária à produção da ciência; a indução de ações determinadas pelo MEC, sem ouvir a comunidade universitária, como a pressão pelo retorno presencial, ou no caso do chamamento de eleições para os Centros sem a Consulta Pública, sempre realizadas pelas entidades.

Por último, a recente nomeação do Reitor constante na lista tríplice, mas que não participou da Consulta Pública, indica ao mesmo tempo, a retirada da ingerência direta do MEC da UFS, mas a continuidade do debate público e luta política em defesa da democracia e da autonomia no interior da Universidade Federal de Sergipe.

Destacamos que a ADUFS manterá a pauta da autodeterminação da Universidade Federal de Sergipe, por meio da insistência em assegurar que todos os processos eleitorais, sejam para Reitoria ou para os Centros, respeitem as escolhas da comunidade universitária. Consideramos que a agenda de luta do nosso Sindicato, frente às investidas do governo Bolsonaro na Universidade brasileira e frente à nova gestão requer cuidado e responsabilidade com a continuidade da Universidade, o que nos leva ao necessário debate com a categoria para a tomada de decisões.

É na Assembleia onde serão decididos os rumos da luta sindical. À ADUFS caberá manter a agenda imediata de realizar:

- audiência com a nova gestão para tratar da manutenção do ER enquanto durar a pandemia e enquanto não houver  vacinação que garanta a segurança sanitária e a saúde de todos;

- avaliação e aprimoramento do ER, com vistas a amenizar o adoecimento de docentes, discentes e demais trabalhadoras/és da UFS;

- defesa da democracia interna na UFS, no que diz respeito às eleições dos Centros/Campi (São Cristóvão, Aracaju, Lagarto, Laranjeiras, Sertão) e CODAP.

A diretoria da ADUFS entende que, neste momento de profunda crise por que passa o Brasil, faz-se necessária uma avaliação criteriosa da conjuntura numa aliança de todos os setores progressistas da UFS, na defesa da Universidade pública e de seu projeto emancipador.

 

Sergipe, 22 de março de 2021.

A DIRETORIA DA ADUFS

 

 

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